domingo, 16 de novembro de 2008

Emir Sader esculhamba mídia brasileira

Eu achei esse texto no blog do Emir fantástico. É de uma ironia mordaz. Dividimos aqui esta pérola com nossos 5 leitores.

Notícias que a mídia deve à verdade

Se a mídia fosse pagar suas dívidas com a verdade, teria que dar notícias como as seguintes, entre tantas outras. Mandem as de vocês.

FSP (Força Serra Presidente): TAM ASSASSINOU 140 PESSOAS EM CONGONHAS

Corrigimos assim comentário publicado na primeira página do jornal, em que se dizia que “O governo Lula assassinou 140 pessoas em Congonhas”, porque o relatório oficial e final sobre o acidente aponta os erros da companhia como os responsáveis pelo acidente.

Clóvis Rossi e Eliane Catanhede: Os colunistas renunciaram a seus postos de trabalho, sem indenização, confessando que as penas tucanas tinham nublado sua visão, impedindo-lhes de ver como o mundo mudou, como passaram a representar as elites dos jardins de São Paulo, considerando que eram as fronteiras do Brasil. Vão se dedicar a outras atividades, que não prejudiquem o interesse do país.

Otávio Frias Filho: “Renuncio ao cargo que herdei do meu pai, pela única razão de ser filho dele e herdeiro da empresa da família, vou mandar embora todos os amigos que coloquei na redação e convocar eleição entre os outros para eleger algum jornalista de carreira e mérito próprio, para tentar recuperar o prestígio – tão decaído – do jornal, que já teve o Claudio Abramo e que agora está cheio de Fernandinhos, que elogiam minhas camisas.”

O GLOBO: HERDEIROS DE ROBERTO MARINHO DECIDEM HOJE SE VENDEM OS JORNAIS, A TELEVISÃO OU AS RADIOS

Reconhecendo que a concentração de propriedade cruzada é um fator de imensa monopolização e atenta contra a liberdade e a diversidade de expressão, a família Marinho decide acatar o que até as leis dos EUA definem: a proibição de propriedade por um mesmo grupo de mídias televisivas, escritas e radiais no mesmo estado.

Miriam Leitão: “ACREDITEI NO MERCADO E ELE ME TRAIU”

“Confesso que me equivoquei profundamente – por razões que vem ao caso, mas prefiro omitir - em todas as análises ao longo de todos os anos, que acreditei em Pedro Malan, em FHC, em Alan Greenspan, no FMI, nos bancos e instituições financeiras internacionais, no Consenso de Washington, faço autocrítica, renuncio a meus vários empregos na imprensa e prometo estudar economia, história, sociologia, política, antropologia, ética, antes de retomar qualquer emprego público. Doarei parte de meu vasto pecúlio acumulado na mídia e nas conferências feitas para empresários, para um fundo sindical para defesa do nível de emprego. E prometo ler o Zé Simão todos os dias, me chamando de Miriam Porcão, porque eu mereço.”

TV GLOBO PEDE DESCULPAS ÀS VÍTIMAS DO ACIDENTE AÉREO DA GOL NA AMAZÔNIA E CONFESSA QUE ESCONDEU A NOTÍCIA PARA PODER DAR MAIOR DESTAQUE À UMA DENUNCIA CONTRA A CANDIDATURA DE LULA, COM O INTUITO ELEITORAL DE LEVAR SEU CANDIDATO PREFERIDO, ALCKMIN, AO SEGUNDO TURNO.

O ESTADÃO CONFESSA: TENTAMOS, AO LONGO DE TODA SUA EXISTÊNCIA, FAZER PREDOMINAR OS INTERESSES DE SÃO PAULO SOBRE OS DO RESTO DO BRASIL – QUE SEMPRE CONSIDERAMOS “RESTO” – COERENTES COM O MOVIMENTO SEPARATISTA DE 1932. APOIAMOS O GOLPE MILITAR, COMO TODOS OS OUTROS JORNAIS, PUBLICAMOS AS VERSÕES MENTIROSAS DA DITADURA SOBRE AS CONDIÇÕES DA MORTE DOS OPOSITORES, SEMPRE ESTIVEMOS COM A DIREITA. DESCULPEM.

Dora Kramer: “O povo tem razão: FHC foi o pior presidente que o Brasil já teve. Eu me deixei iludir por razões que prefiro não expressar aqui.”

VEJA: DESCULPAS AOS LEITORES, AO PT E AO POVO CUBANO, POR NOSSA CAPA ENGANOSA DE QUE A CAMPANHA DO LULA TERIA SIDO FINANCIADA COM DINHEIRO CUBANO. COMO RECOMPENSA, VAMOS FAZER MATÉRIA DE CAPA SOBRE A SAUDE PÚBLICA CUBANA.


Postado por Emir Sader às 10:34

Gilson Caroni batendo no Gilmar Mendes

Gilmar Mendes, quem são os terroristas?

Artigo publicado originariamente na Carta Maior

Ao afirmar que “terrorismo também é crime imprescritível”, em alusão aos que participaram da luta armada contra o regime de 64, o ministro demonstrou que segue a semântica da ditadura militar. Um olhar menos indulgente sobre a ditadura lhe permitiria ver um regime que tinha como metodologia o terrorismo de Estado.

Gilson Caroni Filho

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, tem se notabilizado por um sentimento de urgência no que julga ser seu principal papel como magistrado: dar sustentação jurídica às teses da oposição parlamentar e seu braço midiático no combate ao governo Lula. Mas o faz de forma tão atabalhoada que constrange até mesmo os “bons companheiros”.
Mendes tem sido alvo de crítica até de contumazes articulistas da grande imprensa, uma vez que o primarismo de suas manifestações desnuda, e expõe ao ridículo, uma estratégia traçada para se manter ativa até 2010. Não foi por outro motivo que o jornalista Elio Gaspari, conhecido pelo antipetismo raivoso, escreveu em sua coluna, na Folha de São Paulo, do último domingo:
“O ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, precisa decidir qual é seu lugar no estádio. Ele pode ficar na tribuna de honra, de toga, lendo votos capazes de servir de lição. Pode também vestir as camisas dos times de sua preferência, indo disputar a bola no gramado. Não pode fazer as duas coisas”.
O alerta de Gaspari se respalda na experiência de quem conhece o jogo e tem noção mais acurada do "timing" exigido. Sabe que um juiz que emite prejulgamentos sobre processo em que terá que se manifestar oficialmente se expõe à perda de legitimidade. A judicialização da política guarda similitudes profundas com o noticiário editorializado. E a afinidade de dois campos distintos, quando se torna muito evidente, produz estragos consideráveis para os objetivos das forças conservadoras.
Ao afirmar que “terrorismo também é crime imprescritível”, em alusão aos que participaram da luta armada contra o regime de 64, o ministro demonstrou que segue a semântica da ditadura militar que recomendou aos jornais da grande imprensa a classificação de “terroristas” a todas as ações armadas praticadas por guerrilheiros. Em questão, além da isenção do presidente do Supremo, está seu embasamento conceitual sobre terrorismo.
Diante da confusão, é preciso discutir o que se entende como terror. Afinal, a resistência armada contra a opressão é admitida até pela Carta de Direitos Humanos da ONU. Qual a diferença disso em relação a atos terroristas tal como são definidos pelo direito internacional?
Como indagou o jornalista Cid Benjamim, em artigo publicado em 2001, no Jornal do Brasil, ”teria sido Marighella um terrorista, tal como os autores dos atentados nos Estados Unidos? Teria sido Lamarca um terrorista? E os sandinistas, que derrubaram a ditadura de Somoza? Estadistas hoje respeitados, que lideraram revoluções armadas – como Fidel Castro, por exemplo – foram também terroristas? E os combatentes da Resistência Francesa, também eram eles terroristas?”
Seria interessante o presidente da mais alta corte do país ser apresentado aos protocolos das convenções de Genebra, onde não se confunde terrorismo com direito à resistência, pois neste "não se verifica a intenção de intimidação da sociedade, mesmo porque o que se pretende com o exercício de tal prerrogativa é exatamente o maior apoio possível da maioria da sociedade em favor da causa patrocinada”.
Um olhar menos indulgente sobre a ditadura de 1964 lhe permitiria ver um regime que tinha como metodologia o terrorismo de Estado. Altos comandantes militares fortaleciam e protegiam da vista da opinião pública e da precária justiça existente - com represálias e censuras - os centros de torturas e seus protagonistas mais conhecidos, como o falecido delegado Sérgio Fleury.
Com o governo Médici, o aparato repressivo chegou ao auge com a criação da Operação Bandeirantes. Ler sobre o caso Parasar, capitaneado pelo brigadeiro João Paulo Burnier, para que o serviço de salvamento da FAB entrasse na repressão política, matando ou jogando no alto-mar os corpos dos opositores políticos, talvez servisse como bom exercício de reflexão para Gilmar Mendes. Quem sabe contextualizando a tortura, o ministro não se dê conta de que anistiar quem a praticou seja defender o real terrorismo? É isso que a sociedade espera do judiciário brasileiro? Que se torne uma instituição típica de países conhecidos pela violação de direitos humanos?
Talvez seja o caso de recomendar ao ministro a leitura de “Eros e Civilização”. Nele, Herbert Marcuse afirma categoricamente:
“Esquecer é também perdoar o que não seria perdoado se a justiça e a liberdade prevalecessem. Esse perdão reproduz as condições que reproduzem injustiça e escravidão: esquecer o sofrimento passado é perdoar as forças que o causaram - sem derrotar essas forças”.
É disso que se trata. Ou acertamos nossas contas com o passado - e desse acerto reunimos condições para avançar - ou ficamos refém de um simulacro de democracia.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro.